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Como Retornar com Segurança à Aprendizagem Presencial

Estudo Global Traz Novas Perspectivas Para Orientar Reabertura Segura Das Escolas Brasileiras
Nathalie Zogbi
Principal (Representative)

Desde março de 2020, quando o poder público suspendeu as aulas presenciais no Brasil como resposta à pandemia do novo coronavírus, temos presenciado um debate acalorado sobre a eventual reabertura das escolas de ensino básico. Um ano se passou, e a grande maioria dos alunos brasileiros segue sem poder frequentar a escola, gerando enormes prejuízos para essas crianças e jovens e também para suas famílias.

É preciso reconhecer que tanto os profissionais de educação como os estudantes e seus familiares têm dado o seu melhor para lidar com esse cenário sem precedentes e se adaptar aos novos desafios do ensino à distância. Mas, apesar dessa heroica resposta coletiva, a verdade é que a transição para o aprendizado virtual tem sido extremamente desigual. Muitas escolas sofrem diariamente com as enormes dificuldades impostas pela falta de acesso à tecnologia, pela baixa conectividade e pelos recursos limitados.

Além dos enormes prejuízos gerados para os alunos, o abismo social do país também vem se aprofundando em ritmo inédito. Há três vezes mais alunos negros, pardos e indígenas que não receberam atividades de aprendizagem durante a pandemia do que alunos brancos, resultado das desigualdades raciais, regionais e socioeconômicas que dividem o Brasil.

A disparidade na educação é também geográfica: enquanto a vasta maioria dos estudantes do Sul, Sudeste e Centro-Oeste tem acesso ao ensino remoto, ele está disponível apenas para 52% dos alunos das regiões Norte e Nordeste, notadamente mais rurais, e cujas escolas dispõem de recursos muito mais escassos.

Ainda mais cruel - embora não surpreendente - é o efeito da renda nessa equação: um estudo recente do Banco Mundial mostrou que estudantes que pertencem aos 25% mais ricos da população terão, em média, uma vantagem de aprendizagem equivalente a quase três anos letivos em relação a seus pares de menor renda. O risco de evasão escolar também tem aumentado à medida que as escolas continuam fechadas, com 35% dos pais relatando o risco de seus filhos abandonarem os estudos. Se considerarmos apenas estudantes do Ensino Médio, esse número sobe para alarmantes 58%.

O desenvolvimento socioemocional dessas crianças e jovens também está sob risco. O fechamento de escolas cortou o acesso de crianças e jovens a este canal vital de desenvolvimento, conexão humana e bem-estar físico e emocional; e muitos estão sofrendo de depressão, desesperança e ansiedade.

Ouvir profundamente a comunidade é parte essencial para um retorno bem-sucedido das aulas presenciais. É importante reconhecer as preocupações válidas que muitos educadores, pais e alunos sentem.
Nathalie Zogbi, Principal, Imaginable Futures

O Que Estamos Aprendendo Sobre Planos de Reabertura Seguros

Apesar das adversidades, também podemos vislumbrar boas notícias conforme surgem as primeiras descobertas capazes de orientar como as escolas podem reabrir com segurança e apoiar educadores, alunos e famílias ao longo desse processo. Um estudo realizado pelo Vozes da Educação, que financiamos em parceria com a Fundação Lemann, analisou dados de 21 países da África, Ásia, Europa, América Latina e América do Norte e comparou como eles têm lidado com o retorno ao ensino presencial, trazendo novas informações indispensáveis ​​a esse debate e que poderão embasar políticas públicas pautadas pela ciência e pelos dados.

Na vasta maioria dos países pesquisados, o retorno às aulas presenciais não impactou a tendência da curva de contaminação pelo novo coronavírus - seja no âmbito local ou nacional. O estudo também sugere que profissionais da educação não correm risco maior de infecção do que outras profissões, embora esse risco aumente em casos de contato entre muitos adultos e jovens a partir de 16 anos.

Além da análise, o relatório também reúne algumas práticas de reabertura que se mostraram promissoras e podem ser replicadas pelo Brasil e por outros países, incluindo:

  • Reabertura gradual quando a curva de contágio estiver estável ou em declínio: Nos períodos em que os índices de contágio estiverem estáveis ou em declínio, já é possível iniciar a reabertura, que deve ocorrer em fases para as diferentes turmas.
  • Protocolos de saúde pública: Seguir as medidas sanitárias editadas pelas autoridades de saúde, incluindo: higienização constante das escolas, fiscalização do distanciamento físico, diminuição do número de alunos nas salas de aula, horários de aula reduzidos, regime escalonado com dias letivos alternados para os alunos, medição da temperatura dos alunos, entre outros.
  • Adoção de protocolos específicos para grupos de risco: Considerar políticas diferentes para educadores que apresentam maior risco de complicações de saúde devido ao COVID-19. Em alguns países, os educadores que pertenciam aos grupos de risco foram autorizados a continuar ensinando remotamente ou tirar licença remunerada.
  • Monitoramento e contenção de casos isolados: Monitorar situações de potenciais surtos, isolar alunos que tenham testado positivo e fechar as escolas conforme necessário. É importante compreender que fechar não significa que o plano falhou - essa é uma parte natural do próprio processo de retomada das aulas.

Além das práticas promissoras listadas acima, ouvir profundamente a comunidade é parte essencial para um retorno bem-sucedido das aulas presenciais. É importante reconhecer as preocupações válidas que muitos educadores, pais e alunos sentem. Retornar ao aprendizado presencial certamente causa ansiedade e medo, especialmente porque novas variantes do vírus continuam a se espalhar pelo Brasil e por muitos outros países.

Abrir um canal de comunicação aberta com os pais, para que eles possam se conectar diretamente com professores e diretores, também é uma forma de proporcionar um espaço seguro para o diálogo e ajudá-los a se sentirem mais à vontade em permitir que seus filhos voltem à escola. Mais informações sobre essas e muitas outras práticas analisadas e recomendadas podem ser encontradas no relatório, disponível aqui em inglês e aqui em português.

Considerações Finais

Após um ano de pandemia, já passa da hora de nos juntarmos à comunidade global de escolas que estabeleceram protocolos claros para a saúde e começaram a reabrir e retomar o aprendizado presencial. As preocupações de nossos educadores e familiares são muitas e legítimas, em especial nesse momento difícil, mas o Brasil precisa estar preparado para dar início à uma reabertura segura, empreendendo as constantes adaptações que farão parte desse processo. Se não enfrentarmos esse desafio de frente e unidos, estaremos negligenciando não só as crescentes desigualdades de nossa sociedade mas também os reveses psicológicos e emocionais que acometem nossos alunos e suas famílias. À medida que o debate sobre a reabertura das escolas avança, são os dados e a ciência que devem servir de base para a tomada de decisões, oferecendo uma alternativa ao inflamado espírito de polarização que se espalhou pelo debate público brasileiro.

Nossa parceira Carolina Campos, fundadora da Vozes da Educação, recentemente compartilhou conosco que se tivéssemos retomado o ensino presencial em setembro, quando a curva de contágio estava baixa, teríamos oferecido com dignidade um semestre inteiro de aulas. Nós concordamos. Nossas crianças precisam retornar às escolas assim que for seguro. Protocolos de segurança serão o "novo normal". Não podemos arcar com os custos de manter as escolas fechadas indefinidamente.